A Revolução que Nasceu da Ousadia
Às vezes, as maiores revoluções começam com um ato de rebeldia aparentemente simples. Na década de 1960, na propriedade Tenuta San Guido em Bolgheri, o Marquês Mario Incisa della Rocchetta fez algo impensável para a época: plantou Cabernet Sauvignon na Toscana, região consagrada pelo Sangiovese. O resultado dessa ousadia não apenas desafiou convenções – redefiniu completamente o conceito de excelência vinícola italiana.
Nascia o Sassicaia, e com ele, uma categoria inteira que viria a ser conhecida como "Super Toscanos". Vinhos que não se encaixavam nas denominações tradicionais, que misturavam uvas internacionais com variedades locais, que eram rotulados como simples "Vino da Tavola" mas alcançavam preços de vinhos classificados. Eram, em essência, vinhos que se recusavam a seguir regras.
Sassicaia - O Pioneiro Visionário
A história do Sassicaia é digna de roteiro cinematográfico. Mario Incisa della Rocchetta amava os grandes Bordeaux e sonhava produzir algo equivalente na Itália. Sua propriedade em Bolgheri, próxima ao mar Tirreno, tinha solos pedregosos (sassicaia significa "lugar pedregoso") semelhantes aos de Graves em Bordeaux.
Durante anos, produziu o vinho apenas para consumo familiar. Somente na década de 1970, incentivado pelo sobrinho Piero Antinori, começou a comercializá-lo. A primeira safra comercial, 1968, foi vinificada pelo lendário enólogo Giacomo Tachis. Quando a Wine Spectator colocou o Sassicaia 1985 no topo de sua lista dos melhores vinhos do mundo, a revolução estava completa.
Tignanello - A Fusão Perfeita
Se Sassicaia desafiou completamente a tradição, Tignanello buscou uma ponte entre tradição e modernidade. Piero Antinori, à frente da Marchesi Antinori (família produtora de vinho há 26 gerações), criou um blend de Sangiovese com Cabernet Sauvignon e Cabernet Franc.
A safra de 1971 foi revolucionária: primeiro Sangiovese moderno envelhecido em barriques francesas, primeiro a incluir uvas não-tradicionais no blend, primeiro grande vinho toscano sem uvas brancas (requisito da época para Chianti). Tignanello provou que era possível honrar raízes enquanto se abraçava inovação.
Ornellaia - Sofisticação sem Limites
Ludovico Antinori, irmão de Piero, seguiu caminho próprio criando Ornellaia na década de 1980. O blend bordalês dominado por Merlot e Cabernet Sauvignon revelou outra faceta de Bolgheri – capacidade de produzir vinhos de riqueza opulenta, taninos aveludados e elegância sedutora.
Com o tempo, Ornellaia conquistou status de cult wine internacional. Cada safra recebe uma obra de arte exclusiva no rótulo, criada por artistas renomados. É vinho que transcende a bebida para tornar-se objeto de coleção.
O Legado e a Controvérsia
Os Super Toscanos causaram debates acalorados. Puristas argumentavam que abandonar uvas autóctones e denominações tradicionais era traição à identidade italiana. Mas os resultados eram inegáveis – esses vinhos "rebeldes" conquistavam pontuações altíssimas de críticos internacionais e preços que rivalizavam com os melhores Bordeaux.
Eventualmente, o sistema de denominações italiano precisou se adaptar. Bolgheri ganhou sua própria DOC em 1994, reconhecendo oficialmente a excelência da região. Hoje, a área que era considerada inadequada para grandes vinhos produz alguns dos rótulos mais cobiçados da Itália.
Além dos Pioneiros
O sucesso dos primeiros Super Toscanos inspirou gerações. Masseto (100% Merlot), Solaia, Guado al Tasso, Le Pergole Torte – cada um trouxe sua própria interpretação do conceito. Alguns mantiveram pureza varietal, outros experimentaram blends inovadores. Mas todos compartilhavam a mesma filosofia: buscar excelência absoluta, independente de regras estabelecidas.
E você, prefere seguir tradições estabelecidas ou está pronto para descobrir vinhos que ousaram reescrever as regras do jogo?
